Segundo Jean-Luc Godard, Jacques Tati procura problemas onde eles não existem, e os encontra. Tati explora e revela os absurdos da assim chamada “normalidade” que, entretanto, de normal nada possui, uma vez que quaisquer relacionamentos entre os homens e, por conseguinte, destes com o mundo que os cerca, estão pautados sobre modelos pré-estabelecidos de comportamento pessoal e de percepção dos objetos e dos acontecimentos que se exibem para serem apreciados, garantindo a continuação do processo civilizatório ocidental baseado no racionalismo, o qual se manifesta, ao longo do século XX, sobretudo através do império tecnológico e da nova organização das forças produtivas. Em Meu Tio, por exemplo, o cineasta ridiculariza a casa futurista dos Arpel – onde “tudo se comunica” (segundo o bordão publicitário proferido pela irmã de Hulot), mas em que, paradoxalmente, não há comunicação entre os membros da família – ao contrapô-la à vida nostálgica da vila onde mora o atrapalhado protagonista, enquanto em Playtime o “refúgio” de Mr. Hulot desaparece por completo, restando apenas a cidade sistematizada e controlada, cujos ambientes são todos iguais, cujos passantes (degenerações do flaneur baudelairiano, feito mero turista) comportam-se todos da mesma maneira.
Playtime, tempo de divertir, tempo de brincar
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